O inglês John Mills, 80, conhecido por ser o biógrafo de Charles Miller e estudar o início do futebol no Brasil, morreu nesta segunda-feira, dia 24 dezembro, em São Paulo.
Mills vinha tratando há alguns anos de um câncer. Estava em casa e passaria o Natal com a família, na zona sul da cidade.
Nascido em Vigo, na Espanha, Mills era filho de pai inglês e mãe basca. Seu avô foi um dos 32 fundadores do Athletic Bilbao. Veio para o Brasil em 1969, após alguns anos morando em Lima, no Peru.
“Vim por motivo de trabalho para ficar alguns meses, mas acabei não indo mais embora”, dizia Mills sobre o início no Brasil.
Foi justamente a vinda para cá que o inspirou a estudar a origem do futebol no país, esporte do qual era mais do que um fã. Mills praticava, estudava e dividia seu amor por quatro equipes: Corinthians, Arsenal, Athletic Bilbao e Juventus. A equipe italiana foi a única que adotou à distância.
A vontade em descobrir as raízes do futebol no Brasil iniciou de forma bem peculiar.
“Em 1969, eu ganhei um calendário da Pirelli. Naquela época eles eram temáticos. Cada ano tinha um assunto e o tema do ano em que cheguei ao Brasil era futebol”, dizia.
“Olhando as fotos vi um jovem de bigodes chamado Charles Miller e o texto que acompanhava a foto dizia que ele tinha começado o futebol por aqui, como jogador do SPAC [São Paulo Athletic Club, hoje Clube Atlético São Paulo, fundado em 1888]. Na hora pensei: esse é meu clube!”
A equipe mencionada por Mills em seus depoimentos era de fato um clube reservado à colônia britânica nos primórdios. Nele se praticava críquete, tênis, entre outros esportes. Ao saber que o futebol começou ali, Mills decidiu se aprofundar.
“Contei com um vasto material já publicado pelo jornalista Thomaz Mazzoni, de ‘A Gazeta Esportiva’, nos anos 50. Ele foi o primeiro a se dedicar ao tema. Depois convivi com a família Miller. Charles já havia falecido [1953], mas a filha dele, Helena, me ajudou com fotos, documentos e depoimentos”, dizia Mills.
O historiador descobriu que Miller fora para a Inglaterra estudar a mando dos pais, um escocês que viera para São Paulo trabalhar na estrada de ferro Santos/Jundiaí e uma paulistana. Uma vez lá, tomou conhecimento do futebol, ainda em suas primeiras décadas, e chegou a defender até o Corinthian (clube que inspirou a fundação do Corinthians Paulista em 1910).
“Miller era um bom jogador. Ele aprendeu e, ao voltar ao Brasil em 1894, queria continuar jogando, mas se decepcionou porque o esporte não era praticado por aqui. Ele passou a ensinar as regras e, em 14 de abril de 1895, organizou a primeira partida regulamentar no Brasil”, dizia Mills.
Aqui vale uma bela explicação. Há muitas histórias sobre o primeiro jogo de futebol no Brasil. Há relatos de que foi em Bangu. Outros apontam que foi em Itu. Alguns dizem que começou no largo São Bento, no centro de São Paulo. E por aí vai.
John Mills nunca negou a existência dessas partidas. Apenas ressaltava que todas tiveram caracter lúdico. Nem sempre eram 11 contra 11. Nem sempre era contra um gol (algumas eram jogadas como uma parede).
Ou seja, não seguiam as regras. Foi Miller que incentivou o início do esporte com regras. O pontapé inicial foi uma partida jogada no bairro do Brás, no centro de São Paulo, estimulando depois o surgimento de novas e equipes e ajudando a criar o primeiro torneio oficial do Brasil, que foi o Campeonato Paulista em 1902.
Mills publicou dois livros sobre o tema. O primeiro foi em 1996: “Charles William Miller, 1894/1994”. O segundo foi em 2005: “Charles Miller, o pai do futebol brasileiro”.
O último grande momento de Mills foi no ano passado, quando participou da inauguração de uma placa em homenagem ao início do futebol no Brasil. A cerimônia foi no centro de São Paulo. A placa foi colocada dentro do CenterBrás-AG, no bairro do Brás, dentro da área aproximada onde ocorreu a primeira partida regulamentar no país.
Mills teve a companhia de Carlos Miller Neto, neto de Charles, Osmar Santos e Oscar Ulisses, representando o rádio e a imprensa esportiva, é o ex-goleiro Zetti, que foi campeão mundial pelo Brasil em 1994, representando os jogadores.
Vale destacar que aquela foi a quinta placa colocada em São Paulo a partir das pesquisas de Mills, que deram início a um projeto chamado “pontos cardeais do futebol”. As outras estão na sede do SPAC e do Paulistano, dentro da igreja do largo da Consolação e dentro do Pacaembu.
Varjota Esportes - Ce. / MSN.
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