Identificado com o Fluminense, Deco revela: 'Vou jogar até o fim de 2013' Em entrevista ao GLOBOESPORTE.COM, apoiador lembra angústia pelas lesões e diz que não conseguirá ficar longe do futebol após a aposentadoria



Deco em três momentos distintos da entrevista: adaptado e feliz no Fluminense após pouco mais de um ano e meio no clube (Foto: Edgard Maciel de Sá/Globoesporte.com)
- Vou jogar mais um ano. Até o fim de 2013. Já decidi isso. Tenho outras hipóteses e propostas, mas não é o meu desejo sair. Minha relação com o Fluminense tem crescendo cada vez mais. Estou muito identificado com o clube, gosto de estar aqui. E sinto que as pessoas também estão contentes com a minha presença. Por isso posso estender o contrato e encerrar a carreira no clube - revelou Deco em entrevista ao GLOBOESPORTE.COM.
Há poucos meses de completar dois anos nas Laranjeiras, o apoiador se vê enfim livre dos seguidos problemas médicos que tanto o angustiaram em 2011. Sem se machucar desde agosto do ano passado e com 55 partidas com a camisa do Fluminense, sendo 25 apenas nos últimos seis meses, Deco diz realizar exercícios diários em casa para evitar sustos.
- Foi feito o possível dentro do clube, com o trabalho conciliado com a comissão técnica para me preservar. A questão não era ser poupado para evitar lesões, e sim para poder render em alto nível. Coincidiu tudo. A chegada do Abel Braga e do Cristiano Nunes (preparador físico), o trabalho nas Laranjeiras e eu gastar tempo para fazer um trabalho extra meu. Identificamos o que estava acontecendo e resolvemos o problema - explica.
Na véspera da partida contra o Arsenal de Sarandí-ARG, nesta quarta-feira, às 19h30m (de Brasília), em Buenos Aires, pela última rodada do Grupo 4 da Libertadores, o camisa 20 recebeu a reportagem para um bate-papo no hall do hotel em que o Fluminense está hospedado na capital argentina. Em pouco mais de meia hora de conversa, Deco resumiu em palavras o que representaria ser campeão da Libertadores, declarou ainda não se considerar ídolo do clube, comentou seus planos para o futuro pós-futebol, entre outros assuntos. Leia abaixo.
Para quem já ganhou duas Ligas do Campeões, qual seria a importância de conquistar a Libertadores?
Costumo dizer que todos os títulos são importantes, mas o marcante é aquele que entra para a história, que mexe com o torcedor. O sabor é especial. O Porto, por exemplo, não ganhava a Liga dos Campeões havia 30 anos quando fomos campeões. O Barcelona não ganhava havia 14. A importância para os torcedores era muito grande. É o que acontece no Fluminense em relação à Libertadores. Seria um título inédito. Quando cheguei, o clube passava a mesma ansiedade em relação ao Campeonato Brasileiro, por exemplo.
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Por tudo o que vivi e aprendi (...) é inevitável que essa experiência tenha um grande valor. Não vou conseguir ficar longe do futebol".
Sobre o futuro
Você é quase um técnico em campo e se interessa pelo trabalho dos dirigentes. Já pensou no que fazer após a aposentadoria?
Ainda não defini isso. Já tenho muita coisa com o que me ocupar, como filhos, projeto social... Mas por tudo o que vivi e aprendi, pelas coisas que ainda vou aprender, é inevitável que essa experiência tenha um grande valor. Não vou conseguir ficar longe do futebol. Por mais que eu pense que não vai dar tempo, vai acabar acontecendo e vou estar novamente ligado ao futebol de alguma forma.
Deco já é ídolo do Fluminense?
Ainda falta. Para ser ídolo é preciso identificação. Títulos apenas não bastam. Existem ídolos de grandes clubes que nunca ganharam nada. A relação de respeito e carinho se conquista com o tempo. Tem tudo para acontecer, sim. Se eu me sentir bem até o fim do ano, posso estender meu contrato por mais um tempo se o Fluminense quiser. Tenho propostas para sair, mas não me vejo nessa situação. Não tenho vontade alguma de deixar o Brasil. Voltei pelos meus filhos e por uma questão familiar. Por isso não gostaria de deixar o país. Na verdade, a tendência é que eu encerre a carreira nas Laranjeiras.
Então se a fase continuar boa você já pensa em renovar?
Vou jogar mais um ano. Até o fim de 2013. Já decidi isso. Tenho outras hipóteses e propostas, mas não é o meu desejo sair. Minha relação com o Fluminense tem crescendo cada vez mais. Estou muito identificado com o clube, gosto de estar aqui. E sinto que as pessoas também estão contentes com a minha presença. Por isso posso estender o contrato e encerrar a carreira no clube.
O gol da vitória na Bombonera é daqueles para se contar aos netos no futuro?
Não penso muito nisso. Gols são importantes pelo que eles significam. Vocês fazer um gol em um jogo importante como aquele, que era importante para a classificação, é sempre legal. Ajudando a vitória ainda ganha um valor maior. Um gol em derrota ou empate não tem o mesmo peso.
Deco no treino do Flu na última terça em Buenos Aires: apoiador deu conselhos importantes a Wellington Nem, mas não se sente um pouco responsável pelo sucesso do jovem (Foto: Divulgação / photocamera)
Wellington Nem sempre cita você nas entrevitas coletivas. Como é a sua relação com um dos destaques da temporada?
Sempre procurei ter uma relação legal com os mais jovens. Nunca gostei de ver aquilo que acontecia no passado, e rolou até comigo, do menino subir e ser zoado pelos mais velhos. Sempre achei isso muita babaquice e nunca tive essa postura. Como passei por situações complicadas, sei das dificuldades, da insegurança dos novos jogadores. Também vivi o outro lado, o dos caras legais. No Porto-POR, por exemplo, me ajudaram bastante. Quando um jogador experiente e de importância do grupo lhe ajuda, a confiança tende a aumentar. Converso muito com o Nem, com o Matheus Carvalho... São pessoas do bem que eu procuro ajudar. Além do mais gosto de ver o Wellington jogando. Ele tem uma qualidade acima da média e vai crescer muito ainda para ajudar o Fluminense. Vejo-o futuramente no nível da Seleção Brasileira. Nem teve o mérito de ser emprestado, triunfar, voltar e conquistar seu espaço em um grupo tão qualificado. Já são motivos suficientes pra ninguém duvidar dele. Além da amizade, fico feliz por seu momento e torço para que ele evolua muito.
Ele diz que você o ajudou a curar uma lesão no púbis levando-o ao dentista. Sente-se de certa forma um pouco responsável pelo sucesso do atacante atualmente?
Ele estava tendo muitos problemas no púbis quando eu cheguei no Fluminense em 2010. Sugeri que ele fosse no dentista. Poderia ter alguma relação com as lesões. Indiquei uma pessoa que eu conhecia com o consentimento do clube. Como ele não tinha muita condição na época, tentei ajudar de alguma maneira. Mas não me sinto responsável por nada. O sucesso depende dele. É óbvio que existe que existe uma pequena influência, mas ele tem o mérito de ter voltado ao Flu e recusado uma proposta para ir para a Rússia tão novo. Acho que a decisão foi muito acertada. Meu único conceito é aconselhar. Com todo respeito ao futebol russo, não acho que o Nem seja jogador para lá. Ele tem condições de jogar na Espanha, na Itália, na Inglaterra... Já até falei isso para ele. É necessário que ele jogue no Brasil antes de se meter em uma Rússia da vida, um local de difícil adaptação. Apenas o aconselho às vezes, mas decisões importantes são sempre tomadas pelo próprio jogador e se hoje ele está jogando bem é porque se esforça e tem méritos para isso.
Você sofreu com as lesões na reta final de 2010 e no ano passado. Agora, parece coisa do passado. O que mudou?
Nada. Existe um planejamento dentro do clube natural da própria comissão. Isso já ajuda a me recuperar melhor e ter uma sequência. Além do trabalho de fazer alongamento em casa e de me cuidar sempre para estar sempre 100%. Acho que foi uma junção de vários fatores: um planejamento legal do clube, do departamento médico, da comissão... O importante é trabalhar para evitar tantas lesões. Se machucar às vezes é normal. O problema é a sequência; Isso sim dá para ser evitado. E a sequência lhe ajuda a chegar no melhor nível. Os jogos trazem mais qualidade.
O único sentimento bacana que sinto ainda com o futebol é estar jogando. Hoje, a concentração e as viagens não têm a mesma graça de antes. Se eu não jogar, não tem muito sentido continuar".
Deco
Os momentos longe dos campos o angustiavam?
Claro. O único sentimento bacana que sinto ainda com o futebol é estar jogando. Hoje, a concentração e as viagens não têm a mesma graça de antes. Se eu não jogar, não tem muito sentido continuar. Para mim, o legal agora é isso. Sentir esse prazer de ganhar e competir é o que me alimenta.
O que era mais chato? Estar lesionado ou ter que dar respostas sobre as lesões?
Estar lesionado. Responder sobre os problemas médicos nunca foi problema para mim. É até natural que a imprensa pergunte. Se você é importante para o time, lhe darão importância fora de campo também. Por isso, a coisa ruim tem a mesma dimensão. Mas não ligo para essas críticas. Claro que existem sempre um ou dois no meio de vários que vão levar para um lado mais complicado de dinheiro, dizendo que estou roubando o clube e tal. Isso me deixava triste. Todos sabem que voltei da Europa para ganhar menos. O problema nunca foi financeiro, até porque deixei claro que não precisavam me pagar caso acontecesse outro problema. A questão era mais essa. As outras contestações da imprensa são até normais.
No auge das lesões você e o Fluminense chegaram a procurar a ajuda de um especialista?
Foi feito o possível dentro do clube, com o trabalho conciliado com a comissão técnica para me preservar. A questão não era ser poupado para evitar lesões, e sim para poder render em alto nível. Coincidiu tudo. A chegada do Abel Braga e do Cristiano Nunes (preparador físico), o trabalho nas Laranjeiras e eu gastar tempo para fazer um trabalho extra meu. Identificamos o que estava acontecendo e resolvemos o problema.
Qual foi a maior decepção da sua carreira?
Não ter ganhado a Eurocopa com Portugal em 2004. De dez jogos como aquele (a final, contra a Grécia), nós ganharíamos nove. Pelo significado que tinha, pelo valor... Talvez ganhar um título importante com a seleção tenha sido a única coisa que faltou na minha carreira. Depois perdemos na semifinal da Copa do Mundo de 2006 para a França, mas ali tudo poderia acontecer.
E a maior alegria?
Foram várias. Ganhei a Liga dos Campeões com o Porto e com o Barcelona, mas a primeira teve um significado diferente. Nas devidas proporções, era o mesmo que ganhar a Libertadores com um time que nunca ganhou nada e tenha um orçamento reduzido. Não que o Porto seja pequeno, pelo contrário. Mas financeiramente ele não tem condições de competir com o Barcelona, por exemplo. É o time que vende para os outros comprarem. Chegar nesse clube e ser campeão com autoridade, e não por causa da sorte, marca muito. Ainda mais que para torcida e para a cidade foi muito importante.
Voltando às decepções, jogar para 500 pessoas no Campeonato Carioca é frustrante?
Para mim nem tanto, mas para quem dirige o campeonato, sim. Se eu representasse a Federação e os clubes me sentiria frustrado. O papel de quem comanda é fazer do futebol um espetáculo. Se vão apenas 500 pessoas ao estádio é porque alguma coisa está errada. Se eu fosse dirigente estaria frustrado, sim. Como jogador gosto de atuar para 30 mil, 100 mil torcedores. Mas com 500 é a mesma responsabilidade. Fico chateado porque não é o mais legal. Alguma coisa está acontecendo. Não é possível o campeonato ter essa média de público e as pessoas acharem normal. Não sei a solução, mas algo precisa ser feito.
Arrepende-se de algo?
Não. Várias coisas não foram programadas, como sair do Brasil aos 18 anos. Eu não queria, mas se não fosse isso eu talvez não tivesse brilhado no Porto e feito tanto sucesso. Poderia até dar certo, mas por outra via, e talvez não fosse a mesma coisa. Demorei também para sair do Porto para o Barcelona. Já tinha 25 anos. Mas por outro lado foi bom passar sete temporadas no Porto. Se eu parar para pensar, não tenho nada para me arrepender. Tinha um ano de contrato ainda com o Chelsea? Sim, mas agora estou sendo muito feliz no Fluminense depois de tudo o que passei.
deco fluminense entrevista (Foto: Edgard Maciel de Sá / Globoesporte.com)No hall do hotel em que o Fluminense está concentrado na Argentina: sem identificação com a atual seleção de Portugal (Foto: Edgard Maciel de Sá / Globoesporte.com)
Em duas vezes em que você foi substituído na temporada, muito se falou de insatisfação por suas atitudes ao sair do campo. Isso mostra que qualquer reação de um jogador profissional ganha uma proporção muitas vezes longe da realidade?
Não digo que o futebol está chato. O problema na verdade é que sobre futebol mesmo pouco se tem para falar. E, ao mesmo tempo, tem muita gente falando. São muitos programas, TVs, jornais... É muita gente vivendo futebol, o que é até natural por ser o esporte mais importante do mundo, mas sobre o jogo em sim pouco há de informações. Por isso é natural que os jornalistas queiram coisas diferentes. É preciso criar. Temos que olhar pelo lado bom. Se o futebol não fosse esse fenômeno, não teríamos tantos jogadores ganhando bem e sendo uma referência para as crianças. A notícia, boa ou má, tem de surgir. Faz parte do mundo em que a gente vive.
Você se difere do estereótipo do jogador de futebol. É articulado, conhece outros países, fala vários idiomas... Considera-se um cara culto?
Posso dizer que tive sorte. Não que ficar no Brasil não te traga isso. Mas viajar, conhecer culturas e línguas me ajudou muito. Hoje falo inglês e espanhol, conheci culturas diferentes e isso tudo me enriqueceu. Ajuda a abrir a cabeça. Não digo que sou culto e nem tenho tal prepotência, mas sou esclarecido. Gosto de ler muito na concentração, por exemplo. Atualmente estou lendo o livro Cilada (do escritor americano Harlan Coben), que tem um estilo policial. Gosto disso.
Para terminar, a seleção de Portugal. Seu ciclo está encerrado mesmo?
Minhas decisões são muito pensadas antes. Encerrei um ciclo que achava que era meu. Não que eu não tenha mais prazer de defender Portugal. Até teria. Mas não me identifico tanto com esse time. São outros jogadores, outra geração... Se a seleção ou treinador pedisse o meu retorno, eu até ponderaria. Mas quando tomei a a decisão é porque sabia que não era mais o momento. Agora sou torcedor. E em 2014 estarei na torcida tanto pelo Brasil quanto por Portugal na Copa do Mundo. 
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