Dunga vê indignação na Seleção, mas admite: "Éramos mais sanguíneos" Técnico afirma que grupo da seleção brasileira não está conformado com resultados, diz que inflama cobrança, mas reconhece reações diferentes à de sua geração

Dunga riu. Muito mais do que costuma rir. Sem se defender de perguntas e sem esconder o momento instável da seleção brasileira, o técnico se soltou na véspera da partida desta terça-feira, contra a Venezuela, em Fortaleza, mesmo tendo que responder inúmeras vezes sobre os problemas que impedem a equipe de jogar um bom futebol. Reflexo ainda da derrota por 2 a 0 para o Chile, na semana passada, estreia das Eliminatórias para a Copa do Mundo de 2018.
Questionado sobre como esse grupo atual reage às dificuldades, o treinador foi o mais protetor possível. Garantiu que há indignação entre os jogadores pelos maus resultados de um ano para cá, mas admitiu que era diferente em sua época.
– Talvez a reação deles não seja igual. Para o torcedor, a reação mais sanguínea era a nossa, e isso pode ter outro significado para quem está fora. Mas eles têm indignação. Estamos cobrando para que haja cobrança entre eles. Eu era um pouco exagerado, eles são mais tranquilos.
O treinador não confirmou – nem negou – que os testes realizados nos treinos, as entradas de Filipe Luís e Lucas Lima nos lugares de Marcelo e Oscar, vão se concretizar na partida. E disse que a comissão técnica não consegue dormir até encontrar uma solução para melhorar o Brasil.
– Nós queremos carinho, mas o torcedor também quer um pouco de alegria, e nós temos plena consciência disso. Eu e minha comissão técnica não dormimos muito bem. Tentamos buscar algo porque o futebol sempre foi uma das alegrias do povo. O Tom Cavalcante (humorista) esteve no hotel ontem e disse que o Brasil precisa de humor, uma alegria para o torcedor sorrir um pouco. Eu não sou muito de dar risada, mas também gosto – disse Dunga, precedido por uma rara expressão pública de leveza.

 
Dunga coletiva Seleção Fortaleza Brasil (Foto: Leo Correia / Mowa Press)
Sentado ao lado de Daniel Alves enquanto o lateral-direito dizia que a Seleção está pagando o pato pela revolta política do povo brasileiro, Dunga comentou sobre outra conta que o atual grupo, mesmo aqueles recém-chegados ainda paga: o da derrota por 7 a 1 para a Alemanha.
– A conta não é nossa, mas estamos aqui e temos que pagá-la, e tentar achar uma forma de solucionar isso. Não é fácil, mas não é impossível pela qualidade dos nossos jogadores. Quando os resultados não vêm, é normal essa cobrança. Por tudo que vem acontecendo no futebol mundial, no Brasil e no mundo, nós, latinos, focamos essa cobrança no futebol. Temos responsabilidade pelo que aconteceu na Copa do Mundo e não podemos nos entregar.
Confira abaixo os outros tópicos da coletiva:
Estamos treinando, testando, são jogadores jovens, mas experientes. Aqui no Brasil a cobrança antes de entrar em campo é bem maior, por isso, às vezes temos que tampar os ouvidos e focar no objetivo 
Dunga, sobre entradas de Lucas Lima e Filipe Luís na equipe
INSATISFAÇÃO– Não vivi, mas, pelo que leio, passamos por uma situação muito parecida com 1950. O Brasil não conseguiu ganhar em casa, fato, temos que conviver com isso. Mas por tudo que se passa no Brasil e no mundo, por uma série de fatores, isso traz responsabilidade e cobrança maiores à Seleção, que sempre foi um cartão de visitas.
COMPROMETIMENTO– Esses jogadores saem da Europa, viajam 10 ou 11 horas, são reconhecidos internacionalmente em seus clubes, ídolos lá fora. Eles têm um preço a pagar, mas têm satisfação por representarem o Brasil. Sofrem uma cobrança que sobre seres humanos normais é quase insuportável, mas a alegria de estar na seleção brasileira tem que ser maior. Hoje, todo mundo desconfia, fala e acusa todo mundo, generaliza os fatos. Temos que conviver com isso.
CRÍTICAS DE ÍDOLOS COMO ROMÁRIO E RONALDO
– Temos que respeitar, mas será que eles não passaram pela mesma situação quando estiveram aqui? O Cafu está aqui, peguem o currículo dele, era cobrado até o último jogo. Esses ídolos teriam que refletir. Muitos deles conseguiram confirmar, passaram por situações adversas e foram vencedores. Quem está do outro lado poderia se colocar um pouquinho no nosso lugar. Estamos buscando o máximo de informações e opiniões, não vamos nos acomodar em nenhum momento, e não deixaremos o grupo ter conformismo. Vamos lutar até conseguirmos esse equilíbrio.
LUCAS LIMA E FILIPE LUÍS– Estamos treinando, testando, são jogadores jovens, mas experientes. Aqui no Brasil a cobrança antes de entrar em campo é bem maior, por isso, às vezes temos que tampar os ouvidos e focar no objetivo. Essa seleção já demonstrou ter equilíbrio e vai buscar fazer um bom jogo para nós mesmos. É claro que queremos retribuir o carinho do torcedor, mas em primeiro lugar precisamos mostrar a nós mesmos do que somos capazes.
GOLEADA– O melhor dos sonhos é fazer um bom trabalho e ganhar para que o torcedor saia contente do estádio. Placares elásticos acontecem uma vez a cada 10, 15, 20 anos.
REAÇÃO APÓS DERROTA PARA O CHILE– Positiva. É um grupo que não se satisfaz nem se contenta. Conversamos com todos, passamos vídeos, falamos sobre o que podemos melhorar. É uma conscientização muito boa.
Daniel Alves Dunga coletiva brasil fortaleza (Foto: Leo Correia / Mowa Press) 

ENTROSAMENTO– Uma equipe como a Alemanha tem seis ou sete jogadores que atuam juntos no clube o ano todo. Chegam na Seleção, é mais fácil. Facilitaria nossa vida se tivéssemos, principalmente no mesmo setor, mas já que não temos, corremos atrás do tempo. Os jogadores vêm uma vez por mês. Para dificultar, nas outras Eliminatórias tínhamos uma semana para treinar, agora eles chegam na terça e jogam na quinta. Isso pesa, temos de achar uma forma de resolver.
Temos que buscar as melhores opções, talvez mudar taticamente, analisar o que podemos introduzir, buscar jogadores em melhor situação física. Mas temos que dar confiança, não podemos trocar a cada jogo 
Dunga
PRESENTE DE DIA DAS CRIANÇAS– Eu gostava de ganhar tudo porque eu não tinha nada, qualquer coisa era lucro. Eu tinha um tio, que já faleceu, e me dava pão de mel. O “top” era chocolate, mas pela situação do tio, eu sabia que todo ano teria o presente. Todo ano eu ia buscar. Primeiro tinha que encher a barriga, senão não tinha força para jogar bola (risos). A vida é feita de alegrias, mas a da bola durava pouco porque era de plástico. Aí pegava na roseira, furava, tinha que botar o chiclete. Era bem mais complicado do que hoje.
MELHOR NOS AMISTOSOS QUE NAS COMPETIÇÕES– A diferença é que nos amistosos, estamos definindo o jogo quando vamos ao ataque. E há vários aspectos de cobrança excessiva. Conversamos, buscamos opiniões, repetimos jogadas, tentamos simular o que vai acontecer nos jogos para que eles tenham mais confiança.
MUDANÇAS NA EQUIPE– Temos que buscar as melhores opções, talvez mudar taticamente, analisar o que podemos introduzir, buscar jogadores em melhor situação física. Mas temos que dar confiança, não podemos trocar a cada jogo.
CONTRA-ATAQUES DESPERDIÇADOS– Desde o início, incentivamos os jogadores a arriscar chutes, dribles. Nos contra-ataques, é preciso tomar uma decisão em segundos. Houve lances contra o Chile em que era para ter chutado, em outros o cruzamento foi bem feito, mas faltou a diagonal do atacante. Se fosse só não chutar, seria muito fácil. Tem de haver movimentação, o outro tem que passar, há uma série de encaixes para fazer. Se fosse só um erro detectável, acabou.
LUCAS MOURA– É um jogador agudo, de bom drible, rápido, tem algumas características um pouco diferentes das do Willian. Nós buscamos alternativas. Falamos muito em tática no Brasil, mas quando se muda o time em função do adversário, dizem que estamos com medo. O jogador brasileiro não é muito habituado a jogar uma partida e não jogar a outra. Temos que evoluir nesse aspecto e trabalharmos para não sermos pragmáticos. 

 Varjota  Esportes - Ce.            /            Globoesporte.

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