'Segunda casa': Zé Roberto se emociona com retorno ao Canindé Meia do Grêmio se orgulha em ser ídolo e ter participado da ‘melhor Lusa da história’. Jogador receberá apoio da mãe, irmão e sobrinho na partida


Zé Roberto com o sobrinho Kelvin
(Foto: Bruno Junqueira / TXT, DVG)
Não há atleta do Grêmio que se sentirá mais em casa a partir das 19h30m contra a Portuguesa, do que Zé Roberto. Formado nas categorias de base da Lusa, o experiente meia de 38 anos fala como se fosse um garoto ao fazer essa viagem no tempo metal. Mesmo sendo um atleta rodado, será a primeira vez que estará no vestiário visitante do Canindé. E isso gera uma explosão de emoções do jogador que funciona como o motor da engrenagem montada por Vanderlei Luxemburgo na equipe gremista.
Talvez essa emoção toda tenha sido motivada pela visita de dois entes muito próximos ao treino do Grêmio deste sábado, realizado no CT do Corinthians. Enquanto os jogadores realizavam a última atividade antes do confronto, na plateia estavam: o irmão Ailton e o sobrinho Kelvin que, aos seis anos, se inspira no tio para sonhar em um dia ser jogador de futebol. Durante a atividade, o jogador ainda achou tempo para relembrar a época de criança empinar pipa com o garoto – brincadeira que o atleta fazia muito quando pequeno.
A dupla estará no Canindé para apoiar Zé Roberto, ainda com o reforço da mãe do atleta, a dona Maria Andrezina, de 71 anos. Ela não assiste a um jogo no Brasil desde 2007, em São Paulo, no estádio Pacaembu. Prefere escolher jogos de menor porte para evitar tumultos.
A Portuguesa foi o início de tudo para Zé Roberto. Foi aprovado em uma peneira como lateral-esquerdo, mas ao longo dos anos foi passado para a meia nas categorias de base. Só que o destino quis que a estreia fosse justamente na lateral, já que os jogadores da posição Marcelo Veiga e Renato Martins estavam lesionados. O desempenho foi tão bom que não saiu mais da função. Só foi voltar para o meio na reta final do Brasileirão de 1996. Por coincidência, aquela Lusa acabou caindo somente na decisão para outro clube que marcaria Zé, mas na atualidade: o Grêmio.
- Foi a melhor Portuguesa da história. Me sinto orgulhoso de fazer parte desse time – orgulha-se.
Zé Roberto lembrou da infância ao brincar de pipa com o sobrinho  (Foto: Bruno Junqueira / TXT, DVG)
GLOBOESPORTE.COM – Qual o sentimento de retornar ao Canindé?
Zé Roberto – Antes não deu nem tempo de pensar nisso. Estávamos concentrados há quase uma semana para esse jogo da Sul-Americana. Agora sim que começa a passar um filme na cabeça, poxa. Foi o meu início, a grande oportunidade, o clube que me projetou. Tudo que sou, tenho e por onde passei começou lá no Canindé. Isso é legal. Faz com eu saiba que não perdi minhas raízes. Já ouvi falar de jogador que não gosta de lembrar de onde veio. Pra mim, não. Isso não sai da minha memória.
Ainda lembra dos medos e receios de um jogador em início de carreira?
Não sabia se ia dar certo. Passa tudo pela cabeça. A grande oportunidade. Será que vai dar certo? Muitos chegaram até ali e não foram adiante. Eu era um garoto, tinha muitas incertezas.
Eu estava na base da Portuguesa, já estava alojado e federado. Parecia tudo tranquilo. Só que mudou a gestão. Começou um boato de que aconteceria uma limpa entre os meninos. Cheguei a ouvir que meu nome estaria na lista. Foi uma fase que fiquei muito preocupado. Eu tinha que ser um jogador profissional para ajudar a minha família. Foi o maior susto.
Como foi o seu início como lateral-esquerdo e a estreia como profissional?
Eu tinha ido bem na Copa São Paulo e fiz a pré-temporada com o grupo profissional. Aí minha estreia aconteceu fora da minha posição (como lateral). Foi lá no Canindé. Se eu estava nervoso? Não, não. Estava muito nervoso (risos). Os dois laterais se machucaram e o Fito Neves, que era o treinador, me colocou ali. Lembro que ganhei um Motoradio como melhor em campo. Aí acabei ficando na função, mesmo com os dois jogadores de nome que tinham sido contratados. Mas eu era quase ponta. O Fito colocava o Roque, volante, para cobrir meus avanços e me deixava livre. A gente saía sempre por ali.
Zé Roberto com o irmão Ailton
(Foto: Bruno Junqueira / TXT, DVG)
É possível dizer que o Canindé é como tua segunda casa, então?
Morei no alojamento do Canindé por uns três anos. Ficava embaixo da arquibancada. Era bom. O pessoal da administração dava tudo que precisava. Nunca faltou nada. Lembro muito porque foi onde tudo começou. Conheci meninos de outros estados. Eu era único de São Paulo. O jeito era morar lá porque faltava dinheiro para a condução.
Qual a importância desse confronto pelo teu passado, presente e o futuro?
O Canindé é um estádio que vai ficar marcado na minha história. O sentimento que tenho é que dali saiu um jovem que tinha muita esperança e agora volta um homem realizado e orgulhoso por tudo o que conquistou. Sempre com a mesma humildade. A diferença é a bagagem: superei muitas dificuldades, construí a família que amo, vivi em países diferentes, conquistei admiração de pessoas de uma forma que nunca imaginei que pudesse acontecer. Agora volto para consolidar um objetivo traçado pelo Grêmio, que é garantir a segunda posição e a vaga direta na Libertadores do ano que vem. Sei que a situação da Portuguesa é delicada, mas tenho que olhar meu lado profissional.
Vê muitas mudanças na Lusa?
Deve ter mudado muita coisa. Passaram muitos presidentes. Tenho poucos amigos que eram daquela época, muitos não estão mais. Mas fico feliz de saber que profissionais que já viveram o dia a dia do clube estão por lá, como o Caio, que jogou lá, e Candinho, ex-treinador. É legal isso.
Será a primeira vez no vestiário do Canindé como visitante. Como será isso?
Sei que quando eu chegar lá, passará o filme de quando fiz a peneira, de quando morei no alojamento, até gandula eu fui. Duas vezes. Era a chance de ver o Dener, um ídolo que eu tinha.
Foi a melhor Portuguesa da história. Me sinto orgulhoso de fazer parte desse time . Ser marcado como um dos ídolos é gratificante. É um sentimento que não tem explicação.
Zé Roberto
Qual a importância pessoal da formação como atleta na Portuguesa?
Saí formado da Portuguesa, mas fui evoluindo, me desenvolvendo. Foi lá que aprendi o que teria de colocar em prática para ser profissional, como a disciplina. Nasci e cresci na periferia. Meu pai saiu de casa e minha mãe trabalhava dois turnos para sustentar a família. Foi a vida que me educou. Minha sorte é que eu era muito centrado, porque a realidade que eu via não era boa. Crimes, drogas. Se eu não fosse forte, teria ido por esse caminho. Tinha que me espelhar em alguém de bem, de força. E me espelhei na minha mãe. Foi a única pessoa que investiu em mim. Graças a ela, cheguei na Lusa. E lá sim, era obrigado a me alimentar bem, tinha horário para dormir, acordar, treinar, descansar. Tudo com regra. Foi um choque. Me marcou bastante. Vi muitos não chegarem por falta de profissionalismo.
Você é um dos principais ídolos da história da Lusa. Como recebe isso?
Foi a melhor Portuguesa da história. Me sinto orgulhoso de fazer parte desse time e dessa história. Ser marcado como um dos ídolos é gratificante para qualquer atleta. É um sentimento que não tem explicação. Foi parecido no Santos e agora está sendo no Grêmio. Em tão pouco tempo, já tenho uma relação maravilhosa com a torcida. Eu nunca vi nada parecido na minha carreira. Imagina alguém chegar para o seu filho e dizer: “poxa, seu pai foi ídolo aqui!”? Isso não tem preço. 



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