Em terceiro na Série B, a oito pontos do líder, Atlético Goianiense, com a perigosa aproximação de rivais (o quinto colocado, Náutico, tem dois pontos a menos), o Vasco navega em águas turbulentas na sua terceira aventura pela segunda divisão em sete anos. O acesso à Série A não está assegurado, tampouco é "garantido" como parecia há semanas. E o que acontece em campo reflete o complexo momento vivido pelo clube.
Apesar da drástica queda de desempenho da equipe, Eurico Miranda não pretende demitir Jorginho, para decidir tudo após o certame. A dispensa, se acontecer, seria após o campeonato. O cartola vascaíno gosta do treinador desde os tempos de jogador, mas o risco de uma "tragédia", com a real possibilidade de não obter o acesso, pode provocar uma reformulação imediata na comissão técnica. Já Eurico Brandão, o Euriquinho, filho do presidente, quer a saída imediata do treinador.
Internamente há quem diga que Jorginho mudou o comportamento após Eurico bancar sua permanência até 2017. O acordo entre os dois foi formalizado depois de forte assédio do Cruzeiro. O Vasco costuma contratar pela carteira de trabalho, não como "pessoa jurídica". A aproximação do técnico com o presidente, e consequentemente com o poder, há tempos tem gerado ciúmes na Colina.
Está claro que houve um erro no planejamento do elenco. O treinador seguiu fechado com os "trintões" que quase fizeram milagre no Brasileiro passado. A oportunidade de "limpar a área" após o rebaixamento foi desperdiçada pelo Vasco, que seguiu com Rodrigo, Júlio César, Diguinho, Júlio dos Santos, Jorge Henrique etc. Pior: exceto o paraguaio, os demais tiveram seus vínculos renovados até dezembro de 2017.
A manutenção dos experientes incomodou nas divisões de base. Como o blog mostrou há um ano, havia grande expectativa pelo maior aproveitamento das revelações de São Januário em 2016, mas isso não acontece. Responsáveis pela área, Nilson Gonçalves e Álvaro Miranda, filho do presidente, queriam o elenco rejuvenescido e sustentavam a ideia de que o Campeonato Carioca seria laboratório para lançar garotos, que seriam maturados na Série B do Brasileiro.
O meia Matheus Pet, por exemplo, iniciou a temporada como titular e logo na terceira rodada do Carioca foi para o banco. E entre janeiro e outubro, pouquíssimos jogadores da base foram utilizados na segundona, casos se Douglas, Alan Cardoso, Andrey, Evander, Caio Monteiro e o próprio Pet. A exceção foi a partida contra o Luverdense, 1 a 1 em Lucas do Rio Verde, onde vários reservas entraram em campo.
Os planos dos homens da base não se concretizaram, especialmente a intenção de fazer uma boa venda para o exterior, o que daria visibilidade ao trabalho do departamento e fortaleceria os cofres. O clube só conseguiu emprestar os meias Bruno Cosendey e Matheus Índio para Vitória de Guimarães e Estoril, de Portugal, respectivamente. Luan é o único cria da base titular absoluto com Jorginho.
Para justificar o baixo aproveitamento das pratas da casa, o treinador precisaria vencer a Série B com os velhos medalhões. Mas o grupo chegou ao limite físico e técnico no final do primeiro turno e o time caiu vertiginosamente de rendimento desde então, com aproveitamento de meio de tabela. Mesmo assim, ninguém no clube imaginava que o Vasco fosse chegar à reta final ameaçado pelas equipes que estão em quinto e sexto.
À exceção de Fellype Gabriel, os demais contratados tiveram aprovação de Jorginho, casos de Yago Pikachu, Rafael Marques, Marcelo Mattos, Júnior Dutra e Ederson. Jorginho não gosta da logística adotada em jogos fora do Rio de Janeiro, com voos fretados, pois considera que os atletas precisam descansar adequadamente após as partidas, além de utilizar o dia seguinte para trabalhos regenerativos.
Já Eurico Miranda crê que não há motivo para pernoitar fora, elevando os custos, se o clube tem o "Caprres" (Centro Avançado de Prevenção, Reabilitação e Rendimento Esportivo), menina dos olhos do dirigente. O local foi criado e projetado por Evangelista, mas o preparador físico do elenco é Joelton Urtiga, que costuma acompanhar Jorginho e com ele esteve no Flamengo em 2013, por exemplo.
O técnico perdeu força com lideranças do elenco em meio a situações como o bate-boca entre o Rodrigo e o treinador de goleiros, Fabio Teppedino, que trabalhou nas categorias de base na passagem anterior de Eurico Miranda pelo clube. Jorginho considerou inconveniente a atitude do zagueiro, o tirou do treino por quebra de hierarquia, relatou ao gerente de futebol Isaias Tinoco, que levou o caso à presidência.
Antes do início do returno, o técnico comandou por duas semanas treinos com os portões fechados e Eurico reuniu o grupo. Rodrigo foi advertido. Mas dois dias antes da ida para Belém, o zagueiro e Teppedino discutiram novamente. O zagueiro deixou a delegação com a justificativa oficial de que passava por "momento delicado". Ele até veiculou uma mensagem pela TV oficial do Vasco da Gama.
Mas nos bastidores comentou-se que Jorginho tomou tal decisão com aprovação do presidente. Após o melancólico empate com o Luverdense, Rodrigo saiu de campo se negando a dar entrevistas enquanto torcedores o xingavam. O zagueiro de 36 anos teve o contrato prorrogado por duas temporadas em julho de 2015 em meio a partidas marcadas por seus duelos contra rivais de Fluminense e Flamengo.
Já Nenê vinha se queixado das constantes mudanças no time. O treinador já disse publicamente que escala de acordo com o adversário, além de contemplar quem está bem nos treinos. No Carioca o time era fácil de ser decorado: Martin Silva, Madson, Luan, Rodrigo e Júlio César; Marcelo Mattos, Diguinho e Andrezinho; Nenê, Jorge Henrique e Thalles. Foi a formação utilizada na maior parte da competição. Na Série B Jorginho não tem conseguido tanto repetir a escalação.
A derrota em casa para o CRB, há um mês, fez jogadores simplificarem a meta. Alegavam que o Vasco tem a obrigação de subir de divisão, não de vencer a Série B. O discurso coincidiu com a perda da liderança para o Atlético Goianiense. Em meio a tudo isso, Eurico parece dever lealdade a Jorginho, que além do Cruzeiro rejeitou convite de Marco Polo Del Nero para assumir a seleção olímpica, preferindo, seguir no Vasco.
O tricampeonato carioca, que não é conquistado desde 1994, é grande meta do presidente para 2017. Caso Jorginho caia, profissionais como Roger Machado, Eduardo Baptista, Guto Ferreira, Gilson Kleina, têm o perfil que ele gosta. Mas se o time ficar mais uma temporada na segundona, a realidade vascaína será outra e as perspectivas assustadoras, com tais nomes, provavelmente, rejeitando eventuais convites.
Mais um ano na segunda divisão seria imenso desastre. As receitas despencariam vertiginosamente, a de TV e os patrocínios mais de 60% por força de contratos. O Vasco seria novamente precificado e sua recuperação muito mais complicada. Eurico não dá sinais de que deixará o poder, independentemente de sua saúde. No Conselho a oposição tem 30 eleitos contra 120 da situação. E a maioria dos 150 beneméritos foram feitos pelo atual presidente ou estão idosos e não mais participam do clube.
Estudo feito pelo blog Balanço da Bola mostra que o Vasco é o exemplo vivo do clube que terá que se reinventar para 2017, mesmo voltando à Série A. Até a rodada 32 realizou 16 jogos como mandante, sendo 14 em São Januário e duas vendas de mando, um disputado na Arena Amazônia e outro em Cariacica. Dos 14 jogos em sua casa, auferiu prejuízo no borderô em nove, totalizando um déficit de R$ 22 mil. Até ali, os seis jogos mais recentes na Colina foram deficitários.
Não fossem os dois mandos vendidos, por R$ 300 mil no Kléber Andrade e R$ 400 mil na Arena Amazônia, o clube teria prejuízo de bilheteria no campeonato. A média de público presente em São Januário até a 32ª rodada era de 5.228 (4.260 pagantes), o que representava apenas 24% da capacidade liberada para o estádio, 21.880 espectadores. Mesmo fora do Rio os públicos foram pequenos: 9.022 em Cariacica e 6.792 em Manaus.
Se olharmos as tabelas acima, o Vasco tem apenas a 6ª arrecadação líquida total da série B, e a 7ª média de público. Na comparação com a Série C, o Vasco teria apenas a quinta arrecadação líquida e a quinta média de público. Até mesmo se no comparativo com a quarta divisão o Vasco faturou menos que o CSA e teve públicos médios menores que o próprio time alagoano, Moto Club e Linense. Vasco 1x1 Luverdense teve 2.555 pagantes, 2.873 presentes e renda de R$ 64.745.
As últimas rodadas da Série B definirão se a caravela vascaína voltará a navegar em águas tranquilas. Certo é o voltando à primeira divisão em 2018, o Vasco precisará rapidamente mexer em seu elenco e se redefinir como clube, pois aquele que para muitos "sobraria" na segundona hoje parece candidato a rebaixamento encarando seus tradicionais adversários no ano que vem. Se isso acontecer.
Varjota Esportes - Ce. / MSN.
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