Veja por que um jogo que 'não vale nada' pode mergulhar PSG ou Bayern na crise

Técnicos Unai Emery (esq), do PSG, e Carlo Ancelotti, do Bayern, estão sob pressão© Getty Images Técnicos Unai Emery (esq), do PSG, e  Carlo Ancelotti, do Bayern, estão sob pressão
Nesta quarta-feira, Paris Saint-Germain e Bayern de Munique fazem um jogo "estranho" pela Uefa Champions League, às 15h45 (de Brasília). Na teoria, a partida "não vale nada", já que pouco deve impactar a classificação do grupo B - independentemente do resultado, franceses e alemães devem se classificar sem problemas à frente de Anderlecht-BEL e Celtic-ESC. No entanto, o duelo no Parque dos Príncipes tem muito valor por um motivo: pode trazer guerra ou paz. 
Tanto PSG quanto Bayern vivem dias tumultuados, cada um por polêmicas distintas.
O ambiente do clube francês está abalado desde a polêmica dos pênaltis entre os atacantes Neymar e Cavani, que colocaram muitas dúvidas em cima do projeto parisiense para a temporada, assim como aumentou a pressão sobre o técnico Unai Emery, que parece não estar conseguindo lidar com o "duelo de egos" no vestiário.
Já a equipe alemã vem em um trepidante início de temporada, com atuações muito irregulares, apenas o 3º lugar na Bundesliga (atrás de Borussia Dortmund e Hoffenheim) e reclamações públicas de astros como Robben, Ribéry, Lewandowski e Thomas Muller sobre o trabalho do técnico Carlo Ancelotti.
Por isso, apesar de "não valer nada" em termos de classificação, o duelo em Paris vale para trazer tranquilidade para o vencedor, e também para mergulhar o perdedor de vez na crise. Pode acabar servindo também para salvar o emprego de um dos técnicos, ou determinar a demissão de quem se der mal.
Para analisar o jogo, o ESPN.com.br conta com textos traduzidos de dois grandes especialistas do ESPN FC: os jornalistas Julien Laureus, que cobre futebol francês, e Raphael Honigstein, expert em Campeonato Alemão e autor de livros que são referência para quer entender e analisar o futebol germânico. Confira:
  • Por que o PSG precisa muito vencer o Bayern?
Por Julien Laureus, do ESPN FC - leia o original em inglês aqui
Unai Emery e Carlo Ancelotti não vão passar muito tempo juntos nesta quarta-feira, no Parque dos Príncipes, depois do duelo entre Paris Saint-Germain e Bayern de Munique, pela Champions League. O italiano e seus jogadores deixarão rapidamente o estádio para se dirigirem ao banquete pós-jogo que o clube bávaro sempre organiza após suas partidas internacionais fora de casa.
É uma pena, porque Ancelotti certamente teria bons conselhos para dar ao seu colega de profissão, em um momento em que Emery certamente está precisando. 
Em seus 18 meses em Paris, de janeiro de 2012 ao verão de 2013, Ancelotti também passou momentos complicados. Houve uma derrota para o Reims em que seu cargo foi discutindo publicamente pelo presidente do PSG, Nasser Al-Khelaifi. Houve conflitos de egos entre Zlatan Ibrahimovic e o resto do elenco. Mas Ancelotti, como um mestre da administração de grupos, conseguiu lidar com essas situações. No fim das contas, ele teve muito sucesso - o vestiário e Al-Khelaifi ficaram satisfeitos. Carlo, então, foi para o Real Madrid, onde arrumou outros problemas para resolver.
Assim é a vida dos técnicos, independentemente do nível dos clubes que ele comanda. Um treinador é responsável por arrumar as coisas, por tentar encontrar a harmonia dentro e fora de campo e por criar um bom ambiente, em que os atletas gostam de estar. É justamente com isso que Emery vem tendo dificuldades.
As dicas de Ancelotti sobre como lidar com um ambiente de alta tensão seriam preciosas para o treinador do PSG. Os últimos dias foram cheios de problemas em Paris, e o espanhol em nenhum momento pareceu capaz de tomar as rédeas da situação. 
Houve a disputa entre Neymar e Edinson Cavani durante o jogo contra o Lyon, pelo Campeonato Francês, e todas as consequências desse atrito nos dias seguintes. Veio então o tenebroso empate por 0 a 0 com o Montpellier, no último sábado, quando o PSG perdeu a chance de se tornar o primeiro time na Ligue 1 a vencer seus sete primeiros jogos desde 1936. E esse jogo levantou uma importante questão, para a qual Emery parece ainda não ter resposta: qual será o plano B quando Neymar não puder jogar?
Agora, o Bayern está na cidade, e esse jogo do Liga dos Campeões tornou-se algo gigante para o PSG - e também para Emery. Um resultado ruim nesta quarta-feira certamente tornará as coisas ainda mais tóxicas para o técnico.
Sua péssima atuação no episódio do pênalti Neymar-Cavani deixou todos de cabelo em pé. Todos consideram que ele precisava ter demonstrado autoridade, decidindo ele mesmo quem seria o cobrador oficial do time. Mas ele não fez nada. Os jogadores, para sua surpresa, ainda não sabem quem vai ser o batedor nº 1 da equipe e o que irá acontecer da próxima vez que um árbitro der um pênalti para o PSG. 
Isso manchou a imagem de Emery em Paris. O treinador de 45 anos não vem demonstrando força e não está conseguindo mandar uma mensagem positiva a seus jogadores. Não podemos nos esquecer que, na temporada passada, no humilhante 6 a 1 sofrido para o Barcelona, seus jogadores não seguiram nenhuma de suas instruções no jogo. É como se ele gritasse e berrasse, mas sua voz não fosse ouvida.
Ao mesmo tempo, o poder dos jogadores torna-se cada vez maior no vestiário. E, se eles perceberem cada vez mais fraqueza do técnico, usarão isso a seu favor.
A pressão de Al-Khelaifi também vem se tornando cada vez mais forte. Depois do decepcionante resultado em Montpellier, o "chefão" foi à zona mista e mandou um pequeno alerta a Emery e sua comissão técnica. De novo...
"Acho que esse jogo tem que ser revisto muitas vezes, porque precisamos melhorar muito", disparou. 
No futebol europeu, não há muitos clubes em que o presidente ou os dirigentes poderosos falem tanto com a imprensa. O Bayern é um deles. Uli Hoeness e Karl-Heinz Rummenigge estão em contato frequente com a mídia, geralmente expressando decepção ou infelicidade com alguma coisa. Se eles querem que uma mensagem seja passada para frente, é assim que eles fazem.
Ancelotti, que já teve como chefes nomes como Florentino Pérez, no Real Madrid, e Silvio Berlusconi, do Milan, além do próprio Nasser Al-Khelaifi, no PSG, é conhecido por ter todas as qualidades requeridas para lidar com esse tipo de pressão. Ele consegue se manter focado, e isso provavelmente vem de sua postura sempre relaxada, algo que Emery não tem. Ele é rígido. Rídigo até demais.
Através de seu irmão Igor, que cuida de suas redes sociais, o treinador do PSG sabe tudo o que é dito e escrito sobre ele. Em um contexto similar, no Spartak Moscou-RUS, isso foi um desastre para Emery. Ele assumiu em junho de 2012 e demitido já em novembro, depois de não conseguir lidar com a pressão dos dirigentes e da imprensa russa. 
O jogo contra o Bayern de Munique pode ser um momento definidor para a carreira de Emery no PSG. 
Com uma vitória, ele terá paz - pelo menos por enquanto. Já um empate não seria considerado um desastre, apesar de deixar a equipe bastante pressionada para o duelo contra o Bordeaux, que vive grande fase na Ligue 1, no próximo final de semana.
Uma derrota, no entanto, pode aumentar ainda mais o estresse sobre seus ombros, além de ampliar o "buraco" que existe atualmente entre ele e seus jogadores. E que parece se tornar cada vez maior... 
  • Por que o Bayern precisa muito vence o PSG?
Por Raphael Honigstein, do ESPN FC - leia o original em inglês aqui
Enquanto técnico do Bayern de Munique, Josep Guardiola disse certa vez que a Liga dos Campeões "é como um jantar em um ótimo restaurante", enquanto a Bundesliga é "como aquela pizza ou hambúrguer de todo dia". Carlo Ancelotti, um homem conhecido por seu amor pela boa comida, certamente aprecia esse analogia culinária. E na visita ao Paris Saint-Germain, nesta quarta-feira, o atual treinador do Bayern espera ter uma boa experiência gourmet e sair de barriga cheia.
Uma vitória no Parque dos Príncipes mudaria instantaneamente as percepções sobre a temporada do Bayern até agora, e ajudaria muito a reduzir o nível de descontentamento na Baviera.
É verdade que os atuais pentacampeões alemães já deixaram mais pontos pelo caminho do que o esperado neste estádio (três em seis partidas), permitindo ao Borussia Dortmund tomar o topo da tabela. É verdade também que o desempenho vem sendo bastante irregular a cada jogo. Mas, se o time responder na hora necessária, como no jogo desta quarta-feira, todos esses "pequenos pecados" serão perdoados - ao menos por enquanto. 
Para usar outra metáfora: a visita à capital francesa pode ser uma bela mudança de cenário, como o casal que deixa os problemas de casa e sai para um pequeno período de férias com a família.
Para a preocupação de Ancelotti, porém, essa viagem também tem seus perigos...
O resultado do jogo contra o PSG irá determinar o humor no Bayern pelas próximas quatro semanas, um período que será relativamente tranquilo antes de partidas decisivas contra o RB Leipzig pela Bundesliga e pela Copa da Alemanha, já em outubro. Uma derrota em Paris pode não ter consequências graves em termos de classificação na Champions, mas certamente deixaria a atmosfera em Munique bastante tóxica - mais do que já está.
Como mostraram a derrota para o Hoffenheim, pelo Alemão, e até a vitória sobre o Anderlecht, pela Liga dos Campeões, a latente insatisfação com o trabalho de Ancelotti começa a borbulhar na superfície, procurando qualquer pequena abertura para sair se espalhando como lava. Afinal, as tensões de um vestiário "pesado" como o do Bayern só são controladas com a ajuda de várias vitórias em série. 
E, além disso tudo, o ótimo início de temporada do Borussia Dortmund aumentou os riscos consideravelmente. Pela primeira vez desde a temporada 2011/12, parece que o Bayern já não acha que vai ganhar a Bundesliga com um pé nas costas. Há possibilidade real da equipe terminar o ano apenas com o troféu da Copa da Alemanha, ou até mesmo sem levantar nenhuma taça. Para um clube do tamanho do Bayern, é nada menos que um desastre.
A pressão é cada vez mais forte. No entanto, não parece ser o técnico quem tem mais a perder. Enquanto Ancelotti reconhece a importância do jogo contra o PSG em termos de ter uma primeira metade de temporada mais tranquila, seu futuro a longo termo na Allianz Arena já não está mais sob dúvida.
A não ser que haja uma repentina e violenta mudança de circunstâncias na diretoria ou mesmo no Hoffenheim, onde o jovem Julian Nagelsmann está em stand-by esperando uma chance no Bayern, a "era Ancelotti" irá acabar em junho de 2018, independentemente dos troféus que ele levante ou deixe de levantar.
Mesmo que o Bayern vença a Tríplice Coroa, a saída do italiano ainda é a maior possibilidade. O clube quer um treinador mais proativo, alguém que possa desenvolver um time e tirar o máximo de cada atleta, em tempos em que o Bayern não quer entrar em leilões com os clubes mais "gastões" do futebol europeu por super-estrelas. 
Em seu último livro, Ancelotti escreveu que ele costumeiramente é demitido pelas mesmas razões que foi contratado, e o Bayern atual é um ótimo exemplo disso. Quando a equipe o contratou para ser o substituto de Guardiola, eles queriam um treinador mais calmo e menos exigente, com talento para manter todos felizes. No entanto, o clube viu que esses atributos já não são mais tão decisivos na era das transferências de 222 milhões de euros.
De sua parte, Ancelotti pode até mesmo apontar tudo o que o Bayern vem fazendo para limitar seus poderes, como contratar o ex-lateral direito Willy Sagnol, ídolo do time, para ser seu auxiliar, mesmo sem ele ter feito qualquer pedido do gênero, e também o esforço que ele fez para tentar levar jovens reforços para o elenco, mas que não chegaram por culpa da política da diretoria de evitar gastos exorbitantes.
A rivalidade atual entre o presidente Uli Hoeness e o CEO Karl-Heinz Rummenigge também não vem tornando as coisas fáceis para Ancelotti, apesar de ele sempre parecer levar tudo com sua calma habitual. A possibilidade de em breve ficar sem trabalho aparentemente não o perturba. Ainda assim, ele tem seus motivos para tentar fazer o Bayern ter um pouco mais de coesão e harmonia na quarta-feira, contra o PSG. 
A reputação de Ancelotti como um "super-técnico" foi construída muito graças às suas várias campanhas de sucesso na Liga dos Campeões. Três títulos do torneio o colocaram como um especialista, um cara que pode levar grandes times um pouco mais longe, ultrapassando a linha que muitos tentam, mas falham ao tentar cruzar. Depois de toda a negatividade das últimas semanas, um grande desempenho na França pode servir como uma perfeita e atemporal lembrança de suas qualidades únicas, tanto para o público geral do futebol quanto para seus futuros empregados, seja eles quem forem.
Enquanto o Bayern conseguir se demonstrar competitivo na elite europeia, a mística do treinador de 58 também permanecerá intacta. 

  Varjota  Esportes - Ce.            /            MSN.

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