Brasil Afora: criado por médico, Uniclinic quer sair da UTI no Ceará Time cresceu rapidamente e chegou a disputar título cearense, mas viveu momento de "pior do mundo" e hoje sobrevive da estrutura que montou


Moré marcou apenas um gol pelo Uniclinic na
Segundona (Foto: Diego Morais/Globoesporte.com)
Tarde, em pleno meio da semana. Treino forte no bairro da Lagoa Redonda, extremo leste de Fortaleza. O atacante Moré, com passagens por grandes clubes do Nordeste - incluindo Bahia, Vitória e Ceará -, aparece como um "tiozão" experiente entre um bando de garotos.
- Aqui me sinto bem - conta o atacante de 30 anos.
E é bom que se sinta. Dele e de outros jogadores depende um clube criado por um médico e que leva nome de clínica, mas que precisa mesmo é sair da UTI. Para infelicidade da equipe, o impacto da chegada de Moré, autor de 13 gols pelo Guarani de Juazeiro na Primeira Divisão, não foi suficiente para o Uniclinic retornar à elite do futebol cearense. O clube chegou à última partida da Segundona, no domingo passado, já sem chances de subir. Terminou a competição na terceira colocação e com mais um ano de frustrações.
Batendo na trave
Faltou pouco para o time ascender novamente. Uma derrota na penúltima rodada, para o São Benedito - adversário direto pelo acesso -, acabou com os sonhos do Uniclinic de voltar, ou pelo menos adiou por mais um ano.
Desde que foi rebaixado, em 2008, o time vem sempre batendo na trave. Em 2009, parecia que o retorno seria imediato. A melhor campanha na fase classificatória, porém, foi manchada por uma série de exibições ruins no hexagonal final. Em 2010, o drama foi maior, já que o clube não subiu por apenas um ponto. Ano passado, com mudança na administração, o clube não fez boa campanha, terminando apenas na oitava posição.
Este ano, contratou para a fase final - além de Moré - jogadores experientes, como os meias Zé Augusto e Marquinhos Portugal e o atacante Jéferson Maranhense. A diretoria trouxe ainda o técnico Oliveira Lopes, que dirigiu o Icasa na Primeira Divisão Cearense - e que começou a carreira de treinador justamente no Uniclinic.
- Eu comecei minha carreira aqui como treinador. Já saí e voltei outras vezes. Mas cada vez que eu venho aqui é como se eu tivesse sempre uma dívida de gratidão com o clube. Tenho um carinho muito especial por tudo isto - revela o treinador.
Oliveira Lopes chegou a treinar profissionais e categorias de base do Uniclinic no mesmo ano (Foto: Diego Morais / Globoesporte.com)Oliveira Lopes chegou a treinar profissionais e categorias de base do Uniclinic no mesmo ano (Foto: Diego Morais / Globoesporte.com)
Oliveira Lopes encerrou sua carreira de jogador no Uniclinic em 1998, no ano em que o clube disputou o Campeonato Cearense da Segunda Divisão pela primeira vez, e logo se sagrou campeão. No ano seguinte, Oliveira foi técnico do time profissional e das categorias de base no primeiro ano do clube disputando a elite do futebol cearense.
- Lembro muito daquela época. Foi marcante porque foi também o início de uma história. Lembro muito que conquistamos o título e logo chegamos fortes no ano seguinte - relembra Oliveira.
Anos dourados
Uniclinic disputou a final do 2º turno em 2005 e perdeu para o Fortaleza  (Foto: Gustavo Pelizzon / Ag. Diário)Uniclinic disputou final do returno em 2005 e perdeu
para o Fortaleza (Foto: Gustavo Pelizzon / Ag. Diário)
De fato, o Uniclinic chegou à Primeirona cearense e logo surpreendeu. Em sua primeira campanha, terminou na quinta posição. O mesmo aconteceu no ano seguinte. Em 2001, ficou na quarta colocação, mas foi rebaixado no ano seguinte.
Em 2003, foi vice na Segundona e garantiu o retorno à elite cearense. E o retorno foi ainda melhor do que a primeira passagem. O Uniclinic disputou a semifinal do primeiro turno em 2004, perdendo para o Ceará. Em 2005, em sua melhor campanha, disputou a final do segundo turno, perdendo, na ocasião, para o Fortaleza.
As boas campanhas cessaram nos dois anos seguintes, quando a equipe chegou a ser ameaçada pelo rebaixamento. O pior, no entanto, só se concretizou em 2008.
O pior time do mundo
As cores amarelo e roxo, que representam o Uniclinic, são as mesmas do Tabajara Futebol Clube - time de futebol criado pelo programa Casseta e Planeta, da Rede Globo. Se a turma do Casseta conhecia ou não o time do Uniclinic, não se sabe exatamente, mas bem que a equipe cearense levou a sério e viveu uma terrível fase de Tabajara em 2008.
Saco de pancadas naquele ano (veja no vídeo acima), o clube perdeu todos os jogos do primeiro turno do Campeonato Cearense e ainda mais duas partidas pelo segundo turno, totalizando uma série de 11 derrotas seguidas. Na ocasião, foi considerado o pior time do mundo pela mídia e por torcedores de outros clubes. O primeiro ponto daquele ano só foi conquistado no dia 1º de março, no empate por 2 a 2 com a equipe do Itapipoca, na terceira rodada do returno do Estadual.
Ao final do Campeonato Cearense de 2008, o Uniclinic conseguiu contabilizar incríveis quatro pontos -13 atrás do penúltimo colocado. O time não fugiu da chacota e dos apelidos de "Íbis Cearense" e "Tabajara". Da mesma forma, não escapou do rebaixamento e de mudanças drásticas em sua administração.
Uniclinic foi chamado de pior time do mundo em 2008 (Foto: Kid Júnior/ Agência Diário)Uniclinic foi chamado de pior time do mundo em 2008 ao alcançar a marca de onze derrotas consecutivas (Foto: Kid Júnior/ Agência Diário)
O Criador
O Uniclinic nasceu em 1997 a partir do sonho de um médico apaixonado por futebol. Vanor Cruz, diretor de uma clínica homônima ao clube e conselheiro do Fortaleza, resolveu montar seu próprio time no bairro da Lagoa Redonda. Primeiramente, funcionava apenas como equipe sub-20. No ano seguinte, disputou a Segundona cearense e tornou-se campeão.
O médico cuidou presencialmente do clube até 2008, quando passou o bastão para o filho Davi Cruz. Em dezembro de 2010, a morte de Davi fez com que o fundador se afastasse mais ainda do futebol e do clube que viu nascer.  
Ainda em 2010, arrendou o clube ao empresário gaúcho Getúlio Santos que, desde então, assumiu o desafio de tentar recolocar o Uniclinic entre os grandes. Hoje, Vanor Cruz divide a vida entre Brasil e Estados Unidos, mas sempre faz uma visitinha ao seu clube.
- Ele vem aqui sempre que pode e claro que nos ajuda na medida do que estivermos precisando - declara Léo Castro, diretor de futebol do Uniclinic.
À procura da felicidade
Desde que foi arrendado, o Uniclinic tenta voltar a pensar em dias melhores. Os valores investidos na transação não foram revelados pelo atual dono do clube. Getúlio Santos paga uma taxa mensal ao fundador e tem os direitos de arrecadar e administrar a instituição.
Para driblar a falta de arrecadação na Segundona Cearense - a média por jogo em 2011 foi de R$ 276,91, enquanto em 2012 foi de R$ 195,56 -, o administrador busca parcerias e tenta aproveitar a estrutura do clube de forma mais adequada.
- É difícil continuar na Segunda Divisão, porque arrecadamos pouco e temos menos visibilidade. Precisamos voltar o mais rápido possível para a Primeira, ter mais patrocínios, cotas de televisão para ajudar financeiramente - diz Getúlio Santos.
O Uniclinic tenta fazer valer a boa estrutura que tem. É, por exemplo, a única equipe da capital que possui um Centro de Treinamento pronto e com estrutura adequada. São sete campos de futebol, junto com o campo principal do Estádio Antônio Cruz, na Lagoa Redonda. O local, inclusive, quer estar presente na Copa do Mundo de 2014 como Campo Oficial de Treinamento (COT).
Uniclinic tenta arrecadar também com aluguel de campos e espaços do clube (Foto: Diego Morais / Globoesporte.com)Uniclinic tenta arrecadar também com aluguel de campos e espaços do clube (Foto: Diego Morais / Globoesporte.com)
Para arrecadar, os campos hoje são alugados para eventos festivos. Há também estrutura de academia, restaurante e salão de festas.
Com apenas 15 anos desde sua fundação, a Águia da Precabura, como é conhecido o Uniclinic, não quer permanecer na UTI do futebol cearense. O time tenta se renovar, fazer caixa - e não apenas existir. Trabalha atletas jovens e negocia alguns com clubes maiores.
- Já conseguimos vender em torno de dez jogadores. Foram alguns para o Figueirense, outros para o Grêmio. Nós precisamos focar neste trabalho de base, mas precisamos da visibilidade de uma Primeira Divisão - declara o presidente do clube.
Getúlio assumiu os sonhos de um médico louco por futebol. Agora, precisa dar seguimento, até mesmo por questão de sobrevivência dele, do Uniclinic e de quem sente falta de ver o clube não como um Tabajara, mas como um verdadeiro incômodo aos tradicionais times da capital cearense. 
  
   Varjota  Esportes - Ce.   /   Globoesporte

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