'Lembra dele?' Zé Maria vira espelho para garotos da Fundação Casa Corintiano usa exemplos do futebol para guiar jovens da antiga Febem pelo caminho do esporte. E crê no Timão campeão da Libertadores em breve


O vigor físico, que tanto o destacou, não é mais o mesmo, mas Zé Maria também não precisa utilizar a força bruta. O trabalho dele não é nada fácil, mas, aos 63 anos, o ex-lateral-direito do Corinthians só usa o peso de suas palavras. Quase 30 anos depois de pendurar as chuteiras, ele aproveita a grande experiência como ídolo alvinegro da década de 70 para ajudar os jovens da Fundação Casa, antiga Febem.
Há pouco mais de 12 anos, Zé Maria engajou-se no programa esportivo da Fundação Casa, que busca reabilitar jovens infratores por meio do esporte. No início, o ex-jogador corintiano tinha um contato bem próximo com os garotos, vivia nos pátios do centro, sendo professor e espelho para meninos que não viram a raça dele em campo, mas conheceram as suas histórias. Agora ele está na coordenação do programa e faz um pouco de tudo, até apita jogos de vôlei. As conversas com os jovens não são mais tão frequentes, mas sempre há tempo para um bate-papo.
Zé Maria Corinthians (Foto: Marcos Guerra / Globoesporte.com)Zé Maria passa sua experiência para jovens da Fundação Casa (Foto: Marcos Guerra / Globoesporte.com)
- Converso com esses meninos para lhes passar um pouco da minha formação, da minha educação, da minha experiência, para que possam voltar ao caminho do bem. Você acaba contando um pouco da sua história, da sua vida, das dificuldades, da importância da disciplina - diz o ex-lateral.
Nosso objetivo não é fazê-los grandes jogadores, e sim, grandes homens"
Zé Maria
Experiência nos gramados, Zé Maria tem muita. Além de ter disputado duas Copas do Mundo, sagrando-se campeão mundial em 1970, ele atuou 599 vezes apenas pelo Timão. Foram 13 anos de muitas glórias e amizades. Ele dividiu o campo com Jairzinho, Rivellino, Wladimir, Sócrates e Casagrande. Agora, as histórias das conquistas, como os paulistas de 77 e 79, servem de inspiração para os jovens da Fundação Casa.
Ao contrário de Zé Maria, que teve uma infância regrada pela dura disciplina de seu pai, Durvalino, muitos dos garotos da entidade não têm famílias bem estruturadas e vivem em uma realidade de álcool e entorpecentes. Para guiar esses jovens, Zé Maria usa exemplos do próprio Corinthians. Em 2008, o ex-atacante Casagrande foi internado por problemas com drogas, e, recentemente, o ex-jogador Sócrates também foi hospitalizado para tratar de uma cirrose, em decorrência do consumo excessivo de bebidas alcoólicas. Os dois ídolos corintianos lutam contra as drogas e são apontados como modelos de superação.
- São exemplos de superação não só para os jovens da Fundação. Damos algumas pinceladas sobre o uso de coisas indevidas nas nossas conversas. Tento passar para eles a importância de ter uma boa educação, de respeitar o profissional para ser respeitado, e o esporte tem sido uma ferramenta para isso. Estamos conseguindo resultados maravilhosos, não visamos à formação de profissionais no esporte. É muito mais pelo lado social.
Zé Maria em ação no projeto social de esportes da Fundação Casa (Foto: Divulgação)
Apesar de não ter a formação de jogadores como meta, o programa esportivo da Fundação Casa tem apoio de grandes clubes de futebol, como o Corinthians de Zé Maria. O time firmou uma parceira em que os garotos da entidade podem utilizar as instalações do Parque São Jorge algumas vezes por semana.
- Buscamos um encaminhamento, a oportunidade de eles terem experiências em clubes grandes e conhecerem a importância de trabalhar com um retorno positivo. Encaminhamos os jovens com aptidão para fazerem testes, mas nosso objetivo não é fazê-los grandes jogadores, e sim grandes homens.
Fim de jejum
Seja na Fundação Casa ou em qualquer outro lugar, o Corinthians está no papo de Zé Maria. E sempre foi assim, desde os tempos da roça em Botucatu. Seu pai, Durvalino, era torcedor fanático do Timão e pressionava bastante o filho para que fosse tão craque quanto Djalma Santos e ajudar o Corinthians a dar fim a um jejum de títulos. Depois do Paulista de 1954, quando Zé Maria ainda era garoto, o Alvinegro não levantou mais nenhuma taça. Coube a ele a honra de acabar com a escrita.
O ex-lateral chegou ao Timão em 1970, logo depois de voltar do México com o título de campeão mundial pela Seleção Brasileira. Ele rompeu com a Portuguesa e acertou com seu clube de coração, o que, na época, não era bom negócio, mas acabou dando muito certo.
- A gozação era terrível, tanto que, quando fui contratado, os torcedores questionavam: “Espero que você não seja como muitos que chegaram ao Corinthians e morreram na praia”. Havia uma superstição que o Corinthians matava o jogador. Foi o contrário. Tive muita felicidade no Alvinegro.
Antes de comemorar, porém, Zé Maria passou por um dos momentos mais infelizes da sua carreira. Depois de os corintianos criarem uma grande expectativa pela conquista do Paulistão de 1974, o time acabou perdendo na decisão diante do Palmeiras. Foi um grande baque para Zé Maria, mas a recompensa veio três anos depois. Ele, já como capitão do Corinthians, deu o passe para o gol de Basílio na final do estadual de 77, acabando com um jejum de 23 anos.
- Eu me lembro bem da decisão. Foram três jogos marcantes. Eu tinha dois adversários: a Ponte Preta e o ponta-esquerda, o Tuta, que era meu irmão. Eu ainda tinha de marcá-lo. Tínhamos ciência de que a Ponte era melhor, mas nosso time se superou. Vencemos com muita raça, com muita vontade e apoio da torcida. Minha família é toda de corintianos. Já tinham preparado algo em casa para comemorar depois do segundo jogo, mas eles ganharam, e o Tuta acabou estragando. Só que fiz o desfecho. Foi uma festa maravilhosa – conta Zé Maria.
Desejo de Libertadores
Zé Maria Corinthians (Foto: Marcos Guerra / Globoesporte.com)Zé Maria diz que título da Libertadores do Timão está
perto (Foto: Marcos Guerra / Globoesporte.com)
Agora, das arquibancadas, Zé Maria espera presenciar o fim de uma escrita e ver o Timão levantando a taça da Libertadores. A sete rodadas para o fim do Brasileirão, o Corinthians está na vice-liderança, oito pontos na frente do São Paulo, primeiro time fora da zona de classificação para a competição continental.
O Alvinegro ainda nem confirmou sua presença na Libertadores, mas o ex-jogador já sente que o título está próximo.
- Sofremos lá atrás e conseguimos tirar o time de situações difíceis. A Libertadores é outra ambição, é um sonho. Consigo sentir um pouco daquele sofrimento de 23 anos de jejum nessa busca pela taça da Libertadores, mas ela está próxima - confia o ex-jogador. 
  
  Globoesporte.com  /  Varjota  Esportes.

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